Futuros especulativos para a pesquisa crítica em EdTech

Imagem adaptada de “DSC_4394” by kont1n (CC BY 2.0)

Está disponível – agora completo! – Education and technology into the 2020s: speculative futures, o primeiro número do volume 45 da revista Learning, Media and Technology, que reúne trabalhos de alguns dos grupos e pesquisadores envolvidos na rede (em construção) de pesquisas críticas em EdTech (Critical EdTech) idealizada por Neil Selwyn (Universidade de Monash, Austrália), pesquisador internacionalmente respeitado na área, e Thomas Hillman (Universidade de Gotemburgo, Suécia).

O DEdTec, que integra essa rede, contribuiu não apenas com um artigo, mas também com a escrita do editorial, assinado pelos líderes dos grupos participantes e intitulado What’s next for Ed-Tech? Critical hopes and concerns for the 2020s.

Eis o sumário completo:

(Editorial) What’s next for Ed-Tech? Critical hopes and concerns for the 2020s, de Neil Selwyn (Austrália), Thomas Hillman (Suécia), Rebecca Eynon (Inglaterra), Giselle Ferreira (Brasil), Jeremy Knox (Escócia), Felicitas Macgilchrist (Alemanha) & Juana M. Sancho-Gil (Espanha)

Brave new platforms: a possible platform future for highly decentralised schooling, de Thomas Hillman, Annika Bergviken Rensfeldt & Jonas Ivarsson (Suécia)

Can we avoid digital structural violence in future learning systems?, de Niall Winters, Rebecca Eynon, Anne Geniets, James Robson & Ken Kahn (Inglaterra)

Machine behaviourism: future visions of ‘learnification’ and ‘datafication’ across humans and digital technologies, de Jeremy Knox, Ben Williamson & Sian Bayne (Escócia)

Metaphors we’re colonised by? The case of data-driven educational technologies in Brazil, de integrantes do DEdTec (Brasil)

Moving beyond the predictable failure of Ed-Tech initiatives, de Juana M. Sancho-Gil, Pablo Rivera-Vargas & Raquel Miño-Puigcercós (Espanha e Chile)

Students and society in the 2020s. Three future ‘histories’ of education and technology, de Felicitas Macgilchrist, Heidrun Allert & Anne Bruch (Alemanha)

What might the school of 2030 be like? An exercise in social science fiction, de Neil Selwyn, Luci Pangrazio, Selena Nemorin & Carlo Perrotta (Austrália)

Outras ações estão previstas para a consolidação dessa rede – oportunamente postarei atualizações. Por hora, ficam as indicações de materiais para leitura (alguns artigos estão disponíveis open access): bons estudos!

*What’s next for EdTech?* Artigo publicado

Comecei meu dia com uma excelente surpresa: chegou uma notificação de publicação ahead of print do artigo What’s next for EdTech? Critical hopes and concerns for the 2020s. Trata-se de um texto a várias mãos, uma coautoria dos líderes dos diversos grupos de pesquisa que contribuíram para o número especial da revista Learning, Media and Technology a sair oficialmente em 2020 (parte do material já está disponível ahead of print, como o nosso artigo sobre metáforas de Big Data).

Além dos organizadores do número, Neil Selwyn (Universidade de Monash, Austrália) e Thomas Hillman (Universidade de Gotemburgo, Suécia), contribuíram para o artigo Rebecca Eynon, do Oxford Internet Institute, Universidade de Oxford, Jeremy Knox, da Universidade de Edimburgo, Escócia, Felicitas Macgilchrist, da Universidade de Göttingen, e Juana M. Sancho-Gil, da Universidade de Barcelona.

O texto funcionará como um editorial with a twist: em vez da usual apresentação (burocrática) dos artigos que compõem o número, apresenta-se uma discussão de desafios para a pesquisa na área. A escrita partiu de um exercício proposto pelos organizadores norteado por três princípios:

especular sobre o futuro em termos plausíveis (em vez de fantásticos);

distinguir entre o que é provável, o que é possível e o que é preferível;

pensar em “futuros”, plural, isto é, estar aberto à ideia de variações e direções diferentes que podem muito bem se desenvolver nos próximos anos.

(tradução livre)

Assim, não se trata de futurologia, mas sim de vislumbrar cenários possíveis com base em empiria e teorização do presente.

Realmente é uma grande honra para mim fazer parte desse grupo de pesquisadores mundialmente respeitados, e devo muitos agradecimentos ao Neil pelo convite inicial para integrar a rede internacional que ele e Thomas estão construindo na área de EdTech Crítica.

Assim que todos os artigos estiverem disponíveis, farei uma postagem com links e resumos.

Por hora: tenho 50 e-prints gratuitas do artigo para disponibilizar, então deixo aqui o link para quem estiver interessado.

Boas leituras!

ATUALIZAÇÃO em 24/11/2019: o artigo agora está livre a abertamente disponível – clique aqui para baixar ou ler on-line!

Leitura do fim de semana (furando a fila…)

Chegou ontem (fresquinho do forno e ainda em fase de pré-venda por aqui) o novo livro de Neil Selwyn, Should Robots replace Teachers?, publicado pela Polity.

A contracapa diz o seguinte (tradução livre):

Desenvolvimentos em AI [Inteligência Artificial] e Big Data estão mudando a natureza da educação. Contudo, as implicações dessas tecnologias para a profissão docente são incertas. Enquanto a maior parte dos educadores permanece convencida da necessidade de professores humanos, para além dessa classe de profissionais antecipa-se uma reinvenção da docência e da aprendizagem.

A partir de uma análise de desenvolvimentos tecnológicos tais como robôs-professores autônomos, sistemas de tutoria inteligentes, Learning Analytics [Analíticas da Aprendizagem] e tomada de decisão automatizada, Neil Selwyn ressalta a premência de discussões detalhadas sobre a capacidade a AI replicar qualidades sociais, humanas e cognitivas do professor humano. O autor conduz a discussão sobre AI e educação no domínio dos valores, julgamentos e política, defendendo, basicamente, que a integração de qualquer tecnologia na sociedade precisa ser apresentada como uma escolha.

Além de um prefácio curtinho, o livro tem cinco capítulos:

  • AI, robótica e a automação da docência
  • Robôs na sala de aula
  • Tutoria inteligente e assistentes pedagógicos
  • Tecnologias de “bastidores”
  • Revitalizando a docência para a era da AI

Selwyn é bem conhecido como um crítico sagaz dos discursos exagerados em torno da dita “potência” da tecnologia, e o posicionamento da tecnologia como escolha é algo que permeia seu trabalho. Como diz ele no final do prefácio, “não podemos saber ao certo o que acontecerá, mas deveríamos, ao menos, ter clareza sobre o que preferiríamos que acontecesse”.

Vou tentar dar uma diagonal rápida neste final de semana e postar alguns comentários sucintos – e assim, foi-se o planejamento prévio…



Nem otimista, nem pessimista

Nunca fui diretamente acusada de “tecnofóbica e ludita”, mas já ouvi, repetidamente, que sou “pessimista”. Obviamente não dá para separar ideias de afetos, mas, de fato, são muito fortes os sentimentos associados a visões cor-de-rosa das tecnologias digitais, e não é fácil levantar questionamentos do tipo “e se as coisas não forem exatamente como você diz que elas são?”.

Há anos o escritor Evgeny Morozov vem fazendo perguntas nessa linha, e, a partir delas, oferecendo perspectivas diferentes daquilo que o excesso de otimismo com as tecnologias tem encorajado. Suas críticas são cortantes, e seus posicionamentos, controversos. Neste vídeo, por exemplo, ele questiona a dita “potência” da internet como instrumento de democratização e, a partir disso, discute caminhos alternativos para o ciberativismo (a tradução automática aqui não funciona tão bem, mas dá uma ideia):

Seguindo a mesma linha de seus livros To save everything, click here: the folly of technological solutionism (2013) e The net delusion: the dark side of internet freedom (2012) (não acho que tenham sido traduzidos), Big Tech. A Ascensão dos dados e a morte da política traz uma crítica sempre “direto na jugular”, para usar uma metáfora bem gráfica. A curta seção a seguir ilustra a verve do autor:

Nesse espírito, então, para pensar especificamente sobre a educação – para além de dicotomias bem-mal, bom-mau, otimista-pessimista, dentre tantas -,

(…) é preciso que a escrita, a pesquisa e o debate abordem o uso de tecnologia na educação como problemático. Tal perspectiva não significa assumir que a tecnologia é o problema, mas, sim, reconhecer a necessidade de interrogar seriamente o uso da tecnologia da educação. Isso envolve a produção de análises detalhadas e ricas em contexto, engajamento em avaliação objetiva, e dedicação de tempo para investigar qualquer situação em seus aspectos positivos, negativos e toda e qualquer nuance intermediária. Envolve, também, um posicionamento inerentemente cético, ainda que resistente à tentação de incorrer-se em um cinismo absoluto. Adotando a distinção feita por Michel Foucault, isso envolve ver a aplicação de tecnologia na educação como “perigosa”, em vez de “má”, lembrando que qualquer crítica deve sempre resultar em ação, em lugar de inércia.

(Neil Selwyn, p. 89, capítulo 1 neste livro de 2017 – acesso aberto)

Para completar, aqui está o que Foucault disse:

Meu argumento não é que tudo é mau, mas que tudo é perigoso, que não é exatamente a mesma coisa que mau. Se tudo é perigoso, então sempre temos algo a fazer. Então minha posição leva não à apatia mas a um hiperativismo pessimista.

Foucault em entrevista, em Michel Foucault de Hubert Dreyfus e Paul Rabinow, 1983 (há um pdf aqui – em inglês)

Metáforas da Educação e Tecnologia: versões de artigos para baixar livremente

Acabo de subir para o meu perfil da plataforma academia.edu as versões aceitas dos artigos publicados recentemente da revista Learning, Media and Technology. As versões são muito próximas aos textos publicados, que necessitam de acesso via assinatura (o preço de artigos isolados é absurdo para nós, nem comentemos sobre isso…).

Se alguém estiver interessado em ler os trabalhos, mas tiver problemas em acessá-los no academia, o material está aqui também: Great Expectations: a critical perspective on Open Educational Resources in Brazil (parceria com Márcio Lemgruber) e Metaphors we’re colonised by? The case of data-driven educational technologies in Brazil (parceria com Alexandre Rosado, Márcio Lemgruber e Jaciara Carvalho).

Estou aguardando um reset da minha senha no sistema da revista (são tantas as senhas, me escapam da memória frequentemente), pois cada um dos autores recebe 50 e-prints para distribuir, mas preciso acessar o sistema para pegar o link pertinente. Em breve, circularei esse link aqui, e as primeiras 50 pessoas a acessarem poderão baixar o artigo na versão publicada pela revista.

Boas leituras!

Metáforas de Big Data, educação e novas formas de colonização: artigo publicado!

Acaba de ser publicado ahead of print o artigo Metaphors we’re colonised by? The case of data-driven educational technologies in Brazil, na revista Learning, Media and Technology. O artigo integrará um número temático organizado por Neil Selwyn e Thomas Hillman, que deverá sair no início de 2020 com o título “Education and Technology into the 2020s: speculative futures”.

A história desse trabalho é um pouco longa, daí a grande alegria que senti ao ver a notificação da editora em minha caixa de correio ontem pela manhã. As ideias começaram a surgir em 2015, foram amadurecendo ao longo de um tempo de discussões e estudos, e resultaram, por fim, no projeto atual formalizado em final de 2017, como resumido aqui. Este artigo, em particular, é fruto de um trabalho cuidadoso com um corpo de dados relativamente extenso e uma literatura que começou a surgir mais ou menos ao mesmo tempo em que íamos progredindo com as análises.

Enfim, aqui está uma versão em português do abstract de nossa proposta inicial:

Este artigo discute questões imbricadas na disseminação de tecnologias educacionais baseadas em dados no Brasil. No país, como em outros locais, a Tecnologia Educacional (TecEdu) continua a ser defendida com base em discursos otimistas que a constroem como uma panaceia para problemas sociais historicamente enraizados. Ainda que algumas dessas tecnologias tenham realmente contribuído para importantes programas de ampliação do acesso à educação nas duas últimas décadas, a defesa do “solucionismo tecnológico”, refletida em políticas públicas que articulam demandas cada vez mais fortes de melhoria de eficiências através da “inovação”, tem apoiado a mercantilização implacável dos sistemas educacionais do país. À medida que corporações transnacionais, discretamente posicionadas, assumem o controle de áreas-chave desses sistemas, ameaçando reestruturar todo o setor, tecnologias educacionais baseadas em dados – e outras noções da TecEdu apresentadas como “soluções” para ditas necessidades educacionais – fornecem o último exemplo em uma série de “novas” ideias ofertadas em um mercado em constante expansão. No entanto, essas ideias tendem a ser importadas e implantadas de maneiras frequentemente inconsistentes com as necessidades locais reais. Adotando como referencial teórico um recorte da literatura que explora implicações culturais e políticas da noção de “metáforas conceituais” proposta por Lakoff e Johnson – metáforas que encapsulam maneiras específicas de perceber, pensar e relacionar-se com o mundo – este artigo discute metáforas-chave em discursos acerca de tecnologias educacionais baseadas em dados no Brasil. Com base em dados empíricos coletados de fontes institucionais, midiáticas e de marketing abertas on-line, bem como literatura acadêmica sobre a política da tecnologia, o artigo analisa maneiras nas quais certas metáforas promovem perspectivas que ignoram a diferença e obscurecem questões mais amplas da educação, reproduzindo, assim, problemas previamente existentes. Considerando que dados estão sendo concebidos como o “óleo” que deverá impulsionar uma educação anacrônica para o futuro, por um lado, e reconhecendo a capacidade local reduzida para (pelo menos) adaptar sistemas importados, por outro, o artigo examina criticamente um cenário em que as metáforas da TecEdu talvez estejam a apoiar novas formas de colonização.

Estamos trabalhando em outros produtos dessa parte da pesquisa para disseminação em português, mas, por hora, disponibilizo a versão aceita para publicação, produzida após duas rodadas de revisão por pareceristas e extensas revisões.

Clique aqui para baixar um pdf do artigo em sua versão aceita para publicação.

Clique aqui para acessar a página da revista relativa ao artigo.